FATOR MASCULINO DE INFERTILIDADE CONJUGAL
Uma vez que o fator masculino tem um grande percentual na gênese da infertilidade, é
importante levarmos em conta a possibilidade de estarmos diante de infertilidade de causa
masculina. Tradicionalmente, a infertilidade masculina é considerada uma condição de difícil
tratamento, o que ocorre pelo fato dela não ser uma entidade única, mas refletir uma
variedade de diferentes condições patológicas, dificultando uma estratégia única de
tratamento. Mesmo com o avanço dos métodos diagnósticos, hoje em dia apenas 40% das
causas de infertilidade podem ser reconhecidas, mas os avanços no diagnóstico genético
como a pesquisa de microdeleções (falta de pequenas porções nos cromossomos) parecem
apontar para uma diminuição no número de pacientes com diagnóstico etiológico indefinido.
O fator masculino na infertilidade conjugal é expressivo (existem trabalhos que estimam
em até 50% das causas de infertilidade) e, conseqüentemente, deve ser examinado com muita
atenção por parte de todos os profissionais que desenvolvem suas atividades no campo da
Reprodução Humana.
Mas, não foi sempre assim. Mais por um processo cultural do que pela razão, o fator
masculino foi ignorado por muito tempo. E as marcas desta negação repercutem,
praticamente, até nossos dias. Mas, de qualquer forma, os erros do passado não justificam
omissões no presente. E, por isso, é fundamental a pesquisa do fator masculino concomitante
com o fator feminino, em qualquer casal que esteja enfrentando problemas para engravidar.
Dentre as razões para esta conduta, ressaltam-se as seguintes: simplicidade e eficiência dessa
atitude quando associada a exames bem dirigidos, ausência de invasividade e relação custo-
beneficio apropriada.
O sucesso da injeção intracitoplasmática de espermatozóides (ICSI) – Um único esperma
é injetado com uma micropipeta no interior do óvulo tem transformado a vida de pacientes
com fator masculino severo. O otimismo gerado com este tratamento tem contrastado com a
preocupação das possíveis implicações genéticas decorrentes da manipulação de gametas de
pacientes com contagens espermáticas muito baixas ou anormais.
Geralmente, a infertilidade masculina é descoberta após uma análise do esperma (cerca
de 70% das vezes). A avaliação da história e do exame físico auxiliarão no diagnóstico.
Na investigação do homem infértil, a história clínica bem obtida e o exame físico
minucioso, especialmente na área genital, são recursos valiosos do processo investigativo.
Uma história detalhada pode revelar alguma etiologia; no entanto, o mais comum é a história
ser negativa. Cabe ao clínico avaliar: duração da infertilidade, a paternidade pregressa (filhos
prévios desta ou de outras relações) anomalias congênitas, exposição a fatores de risco,
traumas e doenças na infância, antecedência de doença febril prolongada, inicio e normalidade
da puberdade, hábitos do paciente, cirurgias pregressas, história sexual, antecedentes
infecciosos e doenças sistêmicas, a freqüência de relações do casal, a exposição a fatores
ambientais, etc. Deve-se fazer, portanto, um inventário de toda a história genitourinária.
É importante ter atenção para os problemas de sexualidade que podem interferir de
maneira definitiva no processo de fertilidade. A disfunção sexual e a impotência são situações
que podem vir mascaradas em uma consulta de infertilidade. Portanto é importante o médico
ter a sensibilidade de não expor, ao coletar a história, um contra o outro, uma vez que existem
pontos na vida do indivíduo que, por um motivo ou outro, não é de conhecimento do parceiro.
O exame físico pode, eventualmente, ser indicativo de alguma anormalidade do homem.
Devem ser examinados o testículo, a próstata, o pênis, além dos caracteres gerais.
A avaliação diagnóstica está concentrada no espermograma, embora a análise de apenas
uma amostra de espermograma não seja aconselhável, devido à grande variabilidade, tanto na
avaliação quanto na produção espermática presente normalmente. Sendo assim, em
espermogramas muito alterados, é aconselhável que um mínimo de dois sejam realizados para
uma correta análise.
A emissão de espermatozóides é extremamente variável ao longo do tempo. Por isso,
muitas vezes, para uma adequada avaliação da espermatogênese (formação dos
espermatozóides) é necessária a análise de mais de uma amostra, coletadas com intervalo de,
aproximadamente, 90 dias. Para a coleta do sêmen, a melhor opção é a masturbação, e coleta
em frasco estéril, fabricado com material não-tóxico aos espermatozóides, ou em frasco de
vidro esterilizado.
O período de abstinência sexual recomendado é de 48 a 72 horas, ou de acordo com o
ritmo sexual do casal, no caso de suspeita de alterações decorrentes de intervalos muito curtos
ou longos entre as relações.
É importante que o local de coleta seja silencioso, limpo, com toalhas descartáveis, dotado de
banheiro e de pia anexos. A primeira parte do ejaculado contem 85% dos espermatozóides
ejaculados. Deve-se, portanto, tomar cuidado se houve perda da porção inicial.
Em casos especiais, quando o paciente apresentar dificuldades de coleta no laboratório,
pode-se autorizar a coleta a domicílio, desde que o material seja encaminhado ao laboratório
em seguida após a ejaculação. O frasco deverá ser bem vedado, e mantido à temperatura
ambiente, se possível junto ao corpo.
Nos indivíduos com dificuldades ou impedimento da prática da masturbação, a coleta
poderá ser feita através de relação sexual, usando-se preservativo especial de látex não-
tóxico, devidamente fabricado para esse fim. O preservativo comum pode ser lesivo ao
espermatozóide e alterar a análise qualitativa.
Fatores que alteram a fertilidade masculina
A questão da gonadotoxidade (toxicidade às gônadas: testículos e ovários) é um ponto
de preocupação para todos aqueles que trabalham com infertilidade. Esta toxidade é
determinada por qualquer agente químico, físico ou biológico que possa alterar o sistema
endócrino ou a espermatogênese, causando modificações na fisiologia da reprodução. A
interrupção do processo biológico normal pode ocorrer por ação direta do agente, ou forma
indireta, por meio de seus metabólitos.
Além desses, fatores como stress, idade e peso devem ser levados em conta:
Trauma Testicular
Os pacientes que não tiveram descida de um ou dois testículos até a bolsa escrotal antes
do nascimento geralmente apresentam menor qualidade espermática, independente da
realização cirúrgica precoce da correção. Outros fatores testiculares que podem determinar
uma menor qualidade do ejaculado seriam dores testiculares fortes na infância relacionadas a
episódios de torções testiculares, infecções, doenças venéreas ou uso de medicações. Situações
que provocam febre, como infecções sistêmicas, podem alterar a espermatogênese
temporariamente.
Patologias Sistêmicas
Várias são as causas de patologias sistêmicas que podem levar a uma alteração na
qualidade espermática. Doenças infecciosas (caxumba, tuberculose, lepra e doenças
sexualmente transmissíveis), doenças crônicas (diabete mélito, arteriosclerose, insuficiência
renal, lupus eritematoso sistêmico, hipertensão arterial sistêmica etc.), tumores como
adenoma de hipófise, craniofaringiomas e outros. Pacientes com talassemia maior
desenvolvem infertilidade pela deposição de ferro na hipófise e testículos.
O diabete mélito pode determinar lesões neuropáticas, conduzindo à ejaculação
retrógrada (em direção a bexiga ao invés da uretra).
Substâncias Tóxicas
Há um grande número de substâncias que são tóxicas à produção e função espermáticas.
Vários tipos de medicamentos (alguns antibióticos, quimioterápicos, hormônios e esteróides
anabolizantes), drogas (maconha, cocaína, álcool, cigarro, heroína, crack e etc.)
Fatores ocupacionais e ambientais (calor, luz, radiação eletromagnéticas, etc.), agentes
poluentes, industriais e do meio ambiente têm sido relacionados com alterações da fertilidade,
assim como o stress.
Com relação aos medicamentos e drogas ilícitas, deve-se estar atento para a
identificação daqueles que, sabidamente, possuem efeito negativo sobre a espermatogênese.
As doenças infecciosas causam obstruções parciais ou totais da via seminal e/ou
alterações histológicas gonadais.
Os estrógenos do meio ambiente (pesticidas e herbicidas) e da dieta (plantas, cereais,
frutas, verduras, legumes e sementes oleaginosas) têm sido muito estudados, principalmente
devido à maior incidência de malformações do trato genital nos últimos 50 anos e suspeitas da
diminuição da contagem de espermatozóides.
O aumento da temperatura testicular produz diminuição na qualidade e quantidade de
espermatozóides e também disfunção do epidídimo, como se observa em exposição
ocupacional ao calor (padeiros, confeiteiros, bombeiros, soldadores, etc.).
O efeito da exposição prolongada a metais pesados (cádmio, mercúrio, boro) pode
igualmente determinar alterações na espermatogênese, fibrose testicular e alterações
hormonais.
O tabagismo pode levar à diminuição da produção de espermatozóides e à piora da sua
morfologia e motilidade. Vários pesticidas têm efeitos tóxicos sobre os testículos alterando a
fertilidade e a função sexual.
Gases anestésicos, como o óxido nitroso e o halotano, promovem diminuição da produção
dos espermatozóides, bem como aberrações cromossômicas.
Varicocele
A varicocele (varizes nos testículos) é a condição clínica mais comumente encontrada,
sendo responsável por 18% dos casos; no entanto, somente é considerada como causa de
infertilidade quando associada a padrões espermáticos anormais, o que ocorre em cerca de
10% das vezes. São várias as teorias que tentam explicar as alterações testiculares e seminais
decorrentes destas varizes, porem não está claro por que alguns indivíduos com varicocele são
absolutamente férteis, nem porque 20 a 30% dos pacientes submetidos ao tratamento não
apresentam qualquer melhora dos parâmetros seminais.
Alterações Genéticas
Em grande número de casos, a causa da infertilidade não é definida. Estudos têm
demonstrado uma alta incidência de alterações estruturais e numéricas de cromossomos em
homens inférteis em relação a homens férteis. A maior parte das alterações em cromossomos
sexuais encontra-se em pacientes azoospérmicos (ausência de espermatozóides no ejaculado).
Dez a 15% dos pacientes com azoospermia não-obstrutiva apresentam deleções em seu
cromossomo Y (ausência de fragmentos no cromossomo Y).
A ausência congênita de vasos deferentes (canais que comunicam o testículo com a
uretra) e a fibrose cística são outras causas genéticas que interrompem o transporte dos
espermatozóides até a uretra, sem interferir com a sua produção. Estes pacientes produzem
espermatozóides, mas eles não são ejaculados.
Outros Fatores
Situações que impediriam a função dos espermatozóides, como os anticorpos, são
encontradas em cerca de 5% dos homens; no entanto, o papel dos anticorpos anti-
espermatozóides permanece muito controverso.
O stress provavelmente diminui a fertilidade, mas torna-se difícil saber como mensurar e
definir seu grau de participação.
Não está comprovado que a idade do homem, por si só, o predisponha a infertilidade (ao
contrário da mulher), embora outras doenças que acompanham o envelhecimento possam
predispô-lo à infertilidade, assim como parece haver uma diminuição no volume seminal e na
concentração espermática ao longo dos anos.
A desnutrição crônica provoca alterações hormonais e, juntamente com a deficiência
protéica, interfere na fertilidade.
O peso corporal em excesso e a distribuição de gordura parecem apresentar menores
efeitos sobre o homem do que sobre a fertilidade feminina.